sábado, 22 de junho de 2013

UMA PAUSA PARA LEITURA


PROPOSTA DE ATIVIDADE DE LEITURA

ElaboraçãoPROFA. SUELI APARECIDA SILVA CABRAL
                   PROFA. LUANA PEREIRA BARBOSA
                   PROFA. REGINA CÉLIA MACIEL LEITE

Modalidade Organizativa: Sequência Didática

Público Alvo: 9º Ano do Ensino Fundamental 
                                                  
Tempo Previsto: 3 Aulas

Texto: Pausa de Moacyr Scliar

ESTRATÉGIAS:

Ø  ANTES DA LEITURA

1º Passo: Apresentação da proposta de trabalho e dos objetivos:

Leitura do Texto “Pausa” de Moacyr Scliar com objetivos de:

  • Mobilizar capacidades de leitura e reconhecimento dos elementos de um determinado gênero textual;
  • Possibilitar a leitura de fruição no espaço escolar, explorando uma leitura dirigida com o propósito de ajudar na formação de leitores autônomos e críticos;
  • Formar leitor compreensivo para estabelecer associações e relações com a própria vida, com outros textos lidos e com os acontecimentos atuais.

2º Passo: Atividades orais com foco nas habilidades de ativação de conhecimento prévio, antecipação de expectativas em função da formatação do gênero (segmentação do texto) em função do autor, antecipações e levantamentos de hipóteses:

- Vocês já leram esse texto? Já ouviram falar desse autor? O que sabem sobre ele?
- Qual é o gênero de texto, entre os nossos conhecidos, que você acha que o autor vai apresentar?
- Você acredita que será um texto narrativo, descritivo ou dissertativo?
- Que indícios levaram você a essa hipótese?

Vamos agora explorar o título do texto:

O que é uma pausa?
- Você já precisou alguma vez dar alguma pausa?
- Quando se faz necessário dar uma pausa?

Apresentar o texto para a leitura que será feita de forma compartilhada e com pequenas interrupções para levantamento de hipóteses e instigações necessárias. (Se possível trazer o texto em seu suporte original com cópia impressa para o aluno).

Texto: Pausa

Moacyr Scliar

Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro, fez a barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:
- Vais sair de novo, Samuel?
 Fez que sim com a cabeça. Embora jovem tinha a fronte calva; mas sobrancelhas eram espessas, a barba, embora recém feita, deixava ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.
              - Todos os domingos tu sais cedo  -  observou a mulher com azedume na voz.
 - Temos muito trabalho no escritório – disse o marido, secamente.
            Ela olhou os sanduíches:
            - Por que não vens almoçar?
 - Já te disse: muito trabalho. Não há tempo.  Levo um lanche.
            A mulher coçava a axila esquerda. Antes que voltasse a carga, Samuel pegou o chapéu:
            - Volto de noite.
 As ruas ainda estavam úmidas de cerração. Samuel tirou o carro da garagem. Guiava vagarosamente, ao longo do cais, olhando os guindastes, as barcaças atracadas.
            Estacionou o carro numa travessa quieta. Com o pacote de sanduíches debaixo do braço, caminhou apressadamente duas quadras. Deteve-se ao chegar a um hotel pequeno e sujo. Olhou para os lados e entrou furtivamente. Bateu com as chaves do carro no balcão, acordando um homenzinho que dormia sentado numa poltrona rasgada. Era o gerente. Esfregando os olhos, pôs-se de pé.
             - Ah! Seu Isidoro! Chegou mais cedo hoje. Friozinho bom este, não é? A gente...
 - Estou com pressa, seu Raul! – Atalhou Samuel.
            - Está bem, não vou atrapalhar. O de sempre. – estendeu a chave.
             Samuel subiu quatro lanços de uma escada vacilante. Ao chegar ao último andar, duas mulheres gordas, de chambre floreado, olharam-no com curiosidade.
            - Aqui, meu bem!
            - Uma gritou e riu: um cacarejo curto.
            Ofegante, Samuel entrou no quarto e fechou a porta à chave. Era um aposento pequeno: uma cama de casal, um guarda-roupa de pinho; a um canto, uma bacia cheia d’água, sobre um tripé. Samuel correu as cortinas esfarrapadas, tirou do bolso um despertador de viagem, deu corda e colocou-o na mesinha de cabeceira.
            Puxou a colcha e examinou os lençóis com o cenho franzido; com um suspiro, tirou o casaco e os sapatos, afrouxou a gravata. Sentado na cama comeu vorazmente quatro sanduíches. Limpou os dedos no papel de embrulho, deitou-se e fechou os olhos.
Dormir. 
            Em pouco dormia. Lá embaixo a cidade começava a mover-se: os automóveis buzinando, as jornaleiras gritando, os sons longínquos.
Um raio de sol filtrou-se pela cortina, estampou um círculo luminoso no chão carcomido.
Samuel dormia; sonhava. Nu, corria por uma planície imensa, perseguido por um índio montado a cavalo. No quarto abafado ressoava o galope. No planalto da testa, nas colinas do ventre, no vale entre as pernas, corriam. Samuel mexia-se e resmungava. Às dias e meia da tarde sentiu uma dor lancinante nas costas. Sentou-se na cama, os olhos esbugalhados: o índio acabava de trespassá-lo com a lança. Esvaindo-se em sangue, molhado de suor, Samuel tombou lentamente; ouviu o apito soturno de um vapor. Depois, silêncio.
Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para a bacia, lavou-se. Vestiu-se rapidamente e saiu.
            Sentado numa poltrona, o gerente lia uma revista.
             - Já vai, seu Isidoro?
            - Já – disse Samuel, entregando a chave. Pagou, conferiu o troco em silêncio.
 - Até domingo que vem, seu Isidoro – disse o gerente.
            - Não sei se virei – respondeu Samuel, olhando pela porta; a noite caía.
 - O senhor diz isto, mas volta sempre – observou o homem, rindo.
Samuel saiu.
 Ao longo do cais guiava lentamente. Parou, um instante, ficou olhando os guindastes recortados contra o céu avermelhado. Depois, seguiu. Para casa.

                                 SCLIAR, Moacyr. In: BOSI, Alfredo. O conto brasileiro contemporâneo.São Paulo: Cutrix, 1997


Ø  DURANTE A LEITURA

Nessa fase o foco será nas habilidades de:

- Identificação das pistas linguísticas responsáveis pela continuidade temática ou pela progressão temática.
- Localização ou construção do tema ou da ideia principal.
- Confirmação ou retificação das antecipações ou expectativas de sentido criadas antes ou durante a leitura.
- Construção do Sentido Global do texto.

Questões:

Atente para o seguinte fragmento do texto:

Às sete horas o despertador tocou. Samuel saltou da cama, correu para o banheiro, fez a barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches, quando a mulher apareceu, bocejando:
- Vais sair de novo, Samuel?
     
- A frase destacada do texto confirma alguma hipótese levantada por você, ainda que seja quanto à tipologia textual?
- Quem seria Samuel?
- Por que será que Samuel levantou cedo?
- Qual será o motivo da indagação da mulher?
- Considerando a expressão linguística utilizada pela mulher, pouco usual, dá para se inferir qual região brasileira ou lugar serve de espaço à narrativa.

Observe:

- Todos os domingos tu sais cedo – observou a mulher com azedume na voz.

- O que será que Samuel faz fora de casa todos os domingos?
- Qual será o seu ofício?
- Para onde ele vai? Com quem ele fica? O que ele faz?
- Por que o convívio com a mulher parece não ser agradável para ele? Como seria sua mulher?

Ø  Ao longo da leitura do texto, pode-se ir fazendo questionamentos para instigar a curiosidade dos leitores:

 - Quanto à indicação do espaço através de descrições e pistas linguísticas;
- Do porquê de Samuel adotar outro nome.
- Se ele queria uma “pausa”, o porquê de estar sempre com pressa e atrelado ao relógio, mesmo sendo domingo e de sua voracidade ao comer os sanduíches, enfim.
- Do porquê de mesmo depois de feita a sua barba “o rosto parecia uma sombra azulada. O conjunto era uma máscara escura.”
– Que simbologia poderia ser dada à máscara (teria a ver com sua vida dupla?)

Ø  DEPOIS DA LEITURA

 Construção da síntese semântica do texto, após troca de impressões orais sobre sua leitura, o que será feito através de um registro escrito para melhor compreensão da leitura e no qual poderá acrescentar uma avalição crítica do texto.

 “O domingo é um dia de pausa no trabalho para muitas pessoas que trabalham e estudam. Samuel, no entanto, faz uma “pausa” também na sua rotina familiar, trocando o convívio com a mulher pela solidão em um hotel descrito como sendo pequeno e sujo, onde é conhecido por outro nome e parece ter sonhos de aventura.”

- Você considera certa essa atitude de Samuel? 
 - Que conselhos daria a ele?
- Você sente necessidade de dar alguma “pausa” em sua vida rotineira?
- O que você faria    para fugir da rotina?

  • LEITURAS COMPLEMENTARES

Texto 1 –  Análise do Conto “Pausa” de Moacyr Scliar

        O conto relata a história de Samuel, um jovem rapaz casado com uma mulher aparentemente mal humorada e de companhia desagradável. Todos os domingos Samuel, também chamado de Isidoro, nome que usava como disfarce, era despertado às sete horas da manhã. Se lavava, preparava sanduíches e saia de casa com um pretexto de que iria trabalhar no escritório, mas, a realidade era outra, ele direcionava-se para um hotel pequeno e sujo, onde era atendido pelo porteiro que já o conhecia. Lá passava o dia inteiro dormindo, tentando se refugiar da correria do cotidiano transformando o seu mundo em um mar de sonhos e só após ser despertado por um relógio, retornava para casa, lentamente, observando a paisagem, voltando ao seu mundo real.
A utilização do título “Pausa” pode ser vista tanto como uma possível interrupção na rapidez com que as coisas têm acontecido como também a necessidade de uma reflexão acerca de sua existência e o reflexo dessa postura na sociedade vigente. No decorrer do conto vários caracteres da vida Pós-Moderna vão se apresentando e criando forma através de objetos, atitudes, situações e sentimentos.
O despertador, por exemplo, marca o tempo, a necessidade de cronometrar as atividades a serem realizadas, a fim de, não esquecer e nem se atrasar. Para essa narrativa, este é um objeto de extrema necessidade, pois, Samuel ao ouvi-lo tocar salta da cama e começa a rotina do dia, sendo uma de suas atividades preparar sanduíches, comida de fácil e rápido preparo que marca o processo de industrialização cada vez mais propício a atender a necessidade das pessoas e também seu consequente lucro.
Através do trecho: “Muito trabalho. Não há tempo. Levo um lanche” é possível perceber como a velocidade tem invadido e tornado mecânico o cotidiano das pessoas tanto pelo significado que elas apresentam quanto pelo uso de frases curtas.
O autor também deixa transparecer a sua voz no desenrolar dos acontecimentos com a expressão “dormir”. A personificação também é marca registrada em alguns momentos: “cidade começava a mover-se, automóveis buzinando, noite caia” etc.
Ao fazer a leitura deste conto a nossa curiosidade é aguçada, pois, apesar de, apresentar aparentemente uma interpretação fácil ele nos proporciona caminhar pelas variadas vertentes que nos são apresentadas ao estudarmos o modernismo.
O texto também apresenta a fuga do personagem Samuel, na tentativa se refugiar do stress do dia-a-dia, ao construir uma outra rotina que é praticada aos domingos. No entanto, por mais que ele se isole do mundo “real”, os seus hábitos são característicos da correria do cotidiano, não tem tempo para conversar com o porteiro, as mãos são limpas no próprio guardanapo e não lavadas, enfim, a personagem muda as características de sua rotina, mas, o aspecto da intensa velocidade que o rodeia é a mesma, a vida social está presente em cada instante, pois como ressalta Fábio Lucas a sociedade condiciona o homem e mesmo que se tente fugir dela é inútil.
            Outro aspecto relevante a ser observado é a angústia de Samuel durante o sono, pois, mesmo depois de toda uma preparação para o tão esperado descanso, ele continua agitado, sonhando com brigas, agitações, correrias. Alguns dos seus sonhos tinham certa relação com a natureza, talvez por ser o seu desejo não realizado por falta de tempo.
A figura da esposa de Samuel é apresentada no conto com alguns aspectos que nos leva a entender que há uma espécie de rejeição por parte do esposo. Samuel ao se levantar evita fazer barulho para que ela não perceba que irá sair novamente, prefere comer sanduíches a vir almoçar em casa, o diálogo entre o casal é muito curto e antes que ela fale muito, ele pega o chapéu e sai. 
Esta suposta rejeição também pode ser identificada no texto, num primeiro momento a mulher aparece bocejando, em seguida ela o interroga com um azedume na voz que pode ser identificada de duas formas, ou ela está acordando naquele exato momento, ou estar de mau humor e cansada, e por fim, ela aparece coçando a axila esquerda, comportamentos estes que leva a um  suposto desmazelo, que também pode ser motivo para o desprezo do marido.
Contudo, durante toda a narrativa, a presença de objetos identificadores do tempo é constante, e isso, nos faz refletir que cada momento é cronometrado, que a história é formada em torno de um círculo, de uma rotina, que por mais que a personagem tente construir outro mundo, fugir daquela situação, que até mude o seu nome, ela sempre estará presa a determinados padrões e comportamentos que já estão inseridos na cultura do homem moderno.


Vide outra análise em: <http://amigonerd.net/sociais-aplicadas/letras/analise-do-conto-pausa>, acesso em: 17 jun. 2013 e o trabalho intitulado “A Corrosão do Cotidiano no     Conto “Pausa” De Moacyr Scliar”, por Virgínia Salvador de Oliveira. Disponível em: <http://www.gelne.org.br/Site/arquivostrab/598-GELNE%202.pdf>, acesso em: 17 jun. d 2013

Texto 2 – Pausa

Mário Quintana   

     Quando pouso os óculos sobre a mesa para uma pausa na leitura de coisas feitas, ou na feitura de minhas próprias coisas, surpreendo-me a indagar com que se parecem os óculos sobre a mesa.

     Com algum inseto de grandes olhos e negras e longas pernas ou antenas?

 


          Com algum ciclista tombado? 


         Não, nada disso me contenta ainda. Com que se parecem mesmo?
      E sinto que, enquanto eu não puder captar a sua implícita imagem-poema, a inquietação perdurará.
     E, enquanto o meu Sancho Pança, cheio de si e de senso comum, declara ao meu Dom Quixote que uns óculos sobre a mesa, além de parecerem apenas uns óculos sobre a mesa, são, de fato, um par de óculos sobre a mesa, fico a pensar qual dos dois – Dom Quixote ou Sancho? – vive uma vida mais intensa e, portanto mais verdadeira…
     E paira no ar o eterno mistério dessa necessidade da recriação das coisas em imagens, para terem mais vida, e da vida em poesia, para ser mais vivida.
     Esse enigma, eu o passo a ti, pobre leitor.
       E agora?
Por enquanto, ante a atual insolubilidade da coisa, só me resta citar o terrível dilema de Stechetti: 
 “Io sonno un poeta o sonno un imbecile?”
    Alternativa, aliás, extensiva ao leitor de poesia…
    A verdade é que a minha atroz função não é resolver e sim propor enigmas, fazer o leitor pensar e não pensar por ele.
    E daí?
   – Mas o melhor – pondera-me, com a sua voz pausada, o meu Sancho Pança – , o melhor é repor depressa os óculos no nariz.

A vaca e o hipogrifo. São Paulo,  Círculo do Livro.

                                                          Disponível em <http://maripaivacora.blogspot.com.br/2012/02/pausa.html> Acesso e

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